sexta-feira, 23 de maio de 2014

Conto - PENPAL 5: Screens

Veja as partes anteriores: Footsteps, Balloons, BoxesMaps e Friends.

Eu intencionalmente tenho escondido alguns detalhes de muitas das minhas histórias. Eu deixei que as minhas esperanças influenciassem minha avaliação da forma como as coisas realmente são. Eu não acho que eu precise fazer mais isso.

No final do verão, entre o Jardim de Infância e primeiro grau, eu peguei uma infecção estomacal. Isso tem todos os sintomas da gripe comum; no entanto, com a tal infecção, você vomita em um balde e não na privada, porque você está sentado sobre ela - a doença afeta ambas as extremidades. Isso durou cerca de dez dias, mas antes que ela tivesse passado, consegui estender a doença até os olhos em forma de conjuntivite. Minhas pálpebras estavam tão fundidas pelo muco seco gerado durante a noite que o primeiro dia em que eu acordei com a conjuntivite, eu pensei que tinha ficado cego. Quando eu comecei a primeira série, tive uma torção no pescoço que me obrigou a ficar dez dias de cama, além dos dois olhos vermelhos e inchados. Josh estava em outra sala, e não almoçávamos no mesmo horário, então em um refeitório lotado com duas centenas de crianças, eu tinha uma mesa só para mim.

Eu comecei a levar comida extra na minha mochila para comer no banheiro depois do almoço, já que minhas refeições escolares geralmente eram confiscadas pelas crianças mais velhas que sabiam que eu não iria enfrentá-las, já que ninguém iria me ajudar. Esta dinâmica persistiu mesmo depois da minha condição de saúde melhorar, já que ninguém queria ser amigo do garoto que ficava intimidado, a não ser que quisessem apanhar também. A única razão pela qual isso foi interrompido foi graças a um garoto chamado Alex.


Alex estava na terceira série e era maior do que a maioria das outras crianças de qualquer série. Em torno da terceira semana de escola, ele começou a sentar comigo na hora do almoço, e este fato pôs fim imediato à escassez de minha oferta de alimentos. Ele era um cara legal, mas parecia ser o tipo lento; nós nunca realmente conversamos longamente com exceção de quando eu finalmente decidi perguntar por que ele estava sentado comigo.

Ele tinha uma queda pela irmã de Josh, Verônica.

Verônica estava na quarta série e era, provavelmente, a garota mais bonita da escola. Mesmo como uma criança de seis anos, que tinha a inteira a noção de que as meninas eram repugnantes, eu ainda não sabia o quão bonita Verônica era. Quando ela estava na terceira série, Josh me disse que dois meninos tinham começado uma briga física, que entrou em erupção graças a uma discussão sobre o significado das mensagens que ela havia escrito em seus anuários. Um dos meninos, eventualmente, acertara o outro na testa, com o canto do anuário e a ferida precisou levar pontos. Embora não seja um desses dois meninos, Alex queria que ela gostasse dele e confessou que sabia que Josh e eu éramos melhores amigos; Eu deduzi que ele esperava que eu fosse transmitir a sua ação filantrópica ostensivamente para Verônica e que presumivelmente ela ficaria tão comovida pela sua abnegação que ela se interessaria por ele. Se eu falasse, ele iria continuar a sentar-se comigo durante o tempo que eu precisasse de proteção.

Por este fato ter acontecido durante o tempo em que Josh ficava constantemente na minha casa para construir a jangada e navegar no afluente comigo, eu não tive a chance de contar a Verônica, porque eu simplesmente não a via. Eu disse a Josh sobre isso e ele fez piada com Alex, mas disse que ele iria dizer a sua irmã, já que eu tinha pedido. Eu duvidava que ele contaria. Josh estava chateado que as pessoas prestavam tanta atenção a sua irmã. Eu me lembro dele chamando-a de um corvo feio. Eu nunca disse nada a Josh, mas lembro-me de querer dizer mesmo assim, que ela era bonita e um dia seria linda.

Eu estava certo.

Quando eu tinha quinze anos, eu costumava ver filmes com meus amigos, em um lugar que se chamava Teatro Dirt. Provavelmente esse lugar era bonito em algum momento, mas o tempo e o abandono tinham sido cruéis. Este teatro tinha mesas e cadeiras móveis no piso central, então quando o teatro estava cheio, haviam muitos poucos lugares para que você pudesse sentar e ver a tela inteira. O teatro ainda estava aberto, eu imagino que por três razões: 1) era barato para ver um filme lá; 2) eles mostravam filmes cult diferentes duas vezes por mês à meia-noite; e 3) vendia cerveja para crianças menores de idade durante as exibições à meia-noite. Eu ia por causa dos dois primeiros e, naquela noite, Scanners, de David Cronenberg, estava em cartaz por um dólar.

Meus amigos e eu estávamos sentadosbem no fundo. Eu queria sentar mais para a frente para ver melhor, mas Ryan tinha escolhido os lugares, e então eu cedi. Alguns minutos antes do filme começar, um grupo de meninas entrou. Eram todas muito atraentes, mas qualquer que seja a beleza que poderiam ter tido, foi eclipsada pela menina com o cabelo louro enferrujado, mesmo que eu só tivesse um vislumbre de seu perfil. Quando ela se virou para mover sua cadeira, eu peguei uma visão completa do seu rosto que me deu a sensação de borboletas no estômago - era Verônica.

Eu não a via há muito tempo. Josh e eu acabamos nos vendo cada vez menos depois de nos esgueirarmos à minha antiga casa quando estávamos com dez anos, e geralmente quando eu ia visitá-lo ele estaria com outros amigos. Enquanto todo mundo olhava para a tela, eu olhava para Verônica - só olhando para longe quando a sensação de que eu estava sendo um idiota me vencia, mas esse sentimento rapidamente desaparecia e meus olhos voltavam a fitá-la. Ela realmente era bonita, assim como eu tinha pensado que ela seria quando eu era criança. Quando os créditos começaram a rolar os meus amigos se levantaram e saíram; só havia uma saída e eu não queria ser preso à espera da multidão ir embora. Demorei-me na esperança de prender a atenção de Verônica. Como ela e suas amigas estavam indo em direção à saída, eu aproveitei a oportunidade.

"Hey, Verônica."

Ela se virou para me olhar um pouco assustada.

"Sim?"

Eu saí da minha cadeira e caminhei um pouco em direção a luz que entrava pela porta aberta.

" Sou eu. Um antigo amigo de Josh... Como... Como tem passado?"

" Oh meu Deus! HEY! Já faz tanto tempo!" ela fez um gesto para seus amigos de que ela estaria lá fora em um segundo.

"Sim, já faz alguns anos, pelo menos! Desde a última vez que eu vi Josh. Como ele está?"

" É verdade. Lembro-me dos jogos que vocês costumavam jogar. Você ainda brinca de Tartarugas Ninjas com seus amigos?"

Ela riu um pouco e eu corei.

"Não. Eu não sou mais uma criança... Eu e meus amigos jogamos X-men agora." Eu estava realmente esperando que ela risse.

Ela o fez. " Haha! Você é fofo. Você vem sempre pra cá?"

Eu ainda estava absorvendo o que ela disse.

Será que ela realmente acha que eu sou fofo? Ela acabou de dizer que eu era engraçado? Será que ela acha que eu sou atraente?

De repente, percebi que ela havia me feito uma pergunta, e minha mente soltou uma resposta.

"CLARO!" Eu disse em tom muito alto. "Sim, eu tento de qualquer maneira... e você?"

"Eu venho de vez em quando. Meu namorado não gostava desses filmes, mas já que terminamos, eu pretendo vir mais vezes a partir de agora."

Eu estava tentando ser casual, mas não conseguiu. "Oh, bem, isso é legal... não que seja legal vocês se separarem! Eu só quis dizer que seria legal você vir mais vezes."

Ela riu de novo.

Tentei recuperar, "Então você vai vir daqui há duas semanas? Eles irão mostrar o Dia dos Mortos. É muito legal."

"Sim, eu vou estar aqui."

Ela sorriu, e eu estava prestes a sugerir que talvez a gente pudesse sentar juntos quando ela rapidamente fechou o espaço entre nós e me abraçou.

"Foi muito bom vê-lo", disse ela com os braços em volta de mim.

Eu estava tentando pensar no que dizer, quando eu percebi que o maior problema era que eu tinha esquecido como falar. Felizmente Ryan, que eu podia ouvir se aproximando do corredor, entrou e falou para mim.

"Cara. Você sabe que o filme já acabou, né? Vamo embora, porra! OHHH YEAAHHH."

Verônica me soltou e disse que nos veríamos na próxima vez. Ela foi embora ao som de gemidos pornô que Ryan estava fazendo com a boca. Fiquei furioso, mas a raiva dissipou-se logo que eu ouvi Verônica rindo no lobby.

O dia dos mortos demorou a chegar. A família de Ryan estava saindo de férias e ele não seria capaz de nos conduzir, e meus outros amigos com quem eu estava naquela noite não tinham carros. Um par de dias antes do filme, perguntei a minha mãe se ela poderia me levar. Ela respondeu quase imediatamente, negando meu pedido, mas eu insisti e ela percebeu o desespero na minha voz. Ela perguntou por que eu queria ir tanto, já que eu já tinha visto o filme antes e eu hesitei antes de dizer que eu estava esperando para ver uma menina lá. Ela sorriu e perguntou brincando se ela conhecia a menina e eu, relutantemente, lhe disse que era Verônica . O sorriso desapareceu de seu rosto e ela friamente disse "Não."

Eu decidi que eu ligaria para Verônica para ver se ela podia me pegar. Eu não tinha ideia se ela ainda morava em sua antiga casa, mas valia a pena tentar. Mas então eu percebi que Josh poderia atender. Eu não tinha falado com ele em quase três anos, e se ele atendesse, eu, obviamente, não poderia pedir para falar com sua irmã. Eu me senti culpado por ligar apenas para falar com Verônica e não com Josh, mas descartei esse sentimento rapidamente; Josh não tinha me chamado em anos também. Peguei o telefone e disquei o número que ainda estava embutido na minha memória depois de ter ligado para ele tantas vezes todos esses anos.

Ele tocou várias vezes antes que alguém atendesse. Não foi Josh. Senti uma mistura de alívio e decepção - Percebi naquele segundo que eu realmente sentia falta de Josh. Eu o ligaria depois deste fim de semana e falaria com ele, mas esta foi a minha única chance de ver se Verônica poderia ou iria me levar, então eu perguntei por ela.

A pessoa me disse que eu tinha discado o número errado.

Eu disquei o número novamente, e a pessoa confirmou que era engano. Ela disse que eles devem ter mudado seu número e eu concordei. Pedi desculpas pela perturbação e eu desliguei. De repente eu estava intensamente triste, porque agora eu não poderia entrar em contato com Josh mesmo que eu quisesse; Eu me senti péssimo por ter ficado com medo que ele pudesse atender o telefone. Ele tinha sido o meu melhor amigo. Eu percebi que a única maneira que eu poderia entrar em contado novamente com ele seria através de Verônica, agora, não que eu precisasse de um, eu tinha outro motivo para vê-la.

Eu disse à minha mãe um dia antes do filme que eu não estava mais interessado em ir, mas estava esperando que ela pudesse me deixar na casa do meu amigo Chris. Ela cedeu e me deixou lá no sábado, um par de horas antes do filme. Meu plano era ir a pé de sua casa ao teatro uma vez que sua casa era cerca de meia milha de distância do teatro. A família de Chris ia a igreja todos os domingos de manhãzinha, e dormiam cedo aos sábados, e Chris não se importou que eu saísse, já que estava interessado com uma conversa com uma garota pela internet. Ele disse que o caminho de volta, pra mim, seria muito solitário depois que ela risse quando eu fosse beijá-la. Respondi pra tomar cuidado com os choques quando fosse tentar trepar com o computador àquela noite.

Eu saí da casa de Chris às 11:15 .

Tentei correr pra chegar lá um pouco antes do filme começar. Iria sozinho e não queria ficar lá sozinho esperando.  No caminho para o teatro que eu percebi que se Verônica realmente fosse, seria muita sorte que nós chegássemos ao mesmo tempo, então eu comecei a pensar se eu deveria esperar do lado de fora ou apenas entrar. Ambos tiveram seus prós e contras. Enquanto debatia internamente, percebi que os feixes de farol de carro que passavam ao meu lado na estrada eram agora só um único e constante farol atrás de mim, que se recusava a seguir em frente. A estrada não tinha postes de luz. Eu caminhava na terra, a centímetros do pavimento. Fui pro lado e olhei por sobre o ombro pra ver o que vinha atrás de mim.

Um carro parou cerca de dez metros atrás de mim.

Tudo o que eu podia ver eram os faróis violentamente brilhantes que foram cortando o ambiente de outrora era escura. Eu pensei que poderia ser um dos pais de Chris; talvez eles tinham percebido que fui embora. Chris não teria demorado muito pra confessar que eu saí. Dei um passo em direção ao carro, que quebrou sua pausa e começou a dirigir em direção a mim em um ritmo lento. Ele passou por mim e eu vi que não era o carro dos pais de Chris, ou qualquer carro que eu reconhecesse. Eu tentei ver o motorista, mas estava muito escuro, e minhas pupilas tinham sido afetadas diante das luzes ofuscantes do carro momentos antes. Elas se ajustaram o suficiente apenas para que eu pudesse ver uma enorme rachadura na janela de trás do carro,  antes que fosse embora.

Eu não achei grande coisa; algumas pessoas acham que é divertido assustar outras pessoas - Eu mesmo, muitas vezes, me escondia nos cantos de casa  para assustar minha mãe.

Eu tinha tudo programado, e cheguei lá cerca de dez minutos antes do filme. Eu tinha decidido esperar lá fora até por volta de 11:57, uma vez que me daria tempo para encontrá-la dentro se ela já estava sentada. Quando eu comecei a considerar que ela não viesse, eu avi.

Ela estava sozinha, e ela era linda.

Acenei para ela, que caminhou em minha direção. Ela sorriu e perguntou se os meus amigos já estavam lá dentro. Eu disse que eles não tinham ido, e percebi que isso deve ter parecido a ela que eu estava tentando fazer daquilo, um encontro. Ela não parecia incomodado com isso, nem se preocupou quando eu lhe entreguei o bilhete que eu já tinha comprado. Ela me olhou com curiosidade, e eu disse: " Não se preocupe, eu sou rico". Ela riu e fomos para dentro.

Eu comprei uma pipoca e duas bebidas e passei a maior parte do filme refletindo se devia ou nãocolocar a mão no saco de pipoca ao mesmo tempo que ela, para que nossas mãos se tocassem. Ela parecia gostar do filme e antes que eu percebesse, ele havia acabado. Nós não pudemos ficar dentro do teatro, porque esta foi uma apresentação da meia-noite, e não podíamos ficar batendo papo no hall de entrada, portanto, todos foram orientados para fora.

O estacionamento do teatro era grande porque ele era conectado com um shopping que tinha falido. Não querendo que a noite acabasse, eu continuei a conversar com Verônica enquanto casualmente andávamos em direção ao velho shopping. Como estávamos prestes a contornar a esquina e deixar o teatro fora de vista, olhei para trás e vi que o carro dela não era o único que restava no estacionamento.

O outro tinha uma grande rachadura na janela de trás.

Meu mal-estar que sentira antes, virou alívio.

Isso faz muito sentido. O motorista do carro que me assustou, trabalha no teatro e deve ter percebido que eu estava indo assistir ao filme.

Por medo em um fã de terror parecia um movimento óbvio.

Caminhamos ao redor do shopping e falamos sobre o filme. Eu disse a ela que eu pensei que o Dia dos Mortos era melhor do que Dawn of the Dead, mas ela recusou-se a concordar. Eu disse a ela de quando eu liguei para ela número antigo e sobre o meu dilema sobre quem iria atender o telefone. Ela não achou tão engraçado quanto eu agora achava, mas ela pegou meu telefone e colocar o seu número nele. Ela comentou que aquele era o pior celular que já tinha visto. Sua avaliação piorou quando eu lhe disse que não podia nem receber fotos nele. Liguei para ela para que assim ela tivesse meu número também.

Ela me disse que estava se formando, mas que não se dera realmente bem durante o ensino médio e não tinha certeza se iria pra faculdade. Respondi que devia pôr uma foto junto ao formulário de inscrição e que iriam pagá-la pra estudar só pra poder admirá-la. Ela não riu de primeira e pensei que talvez pudesse ter ofendido – deve ter achado que duvidei de sua inteligência. Me virei em sua direção, nervoso. Estava sorrindo e, mesmo com tão pouca luz, pude ver que corava. Quis pegar sua mão, mas não peguei.

Enquanto caminhávamos para o lado final do shopping de volta para o teatro, eu perguntei a ela sobre Josh. Ela me disse que não queria falar sobre isso. Perguntei-lhe se ele estava, pelo menos, fazendo tudo certo e ela apenas disse: "Eu não sei." Imaginei que Josh deve ter tomado um rumo errado em algum lugar e começou a se meter em encrencas. Eu me senti mal. Eu me senti culpado.

Quando nos aproximamos do estacionamento, notei que o carro com a janela quebrada tinha ido embora e que seu carro era agora o único no estacionamento. Ela me perguntou se eu precisava de uma carona, e mesmo que eu realmente não precisar, eu disse que sim. Eu tinha bebido todo o meu refrigerante durante o filme e toda aquela caminhada estava colocando pressão sobre minha bexiga. Eu sabia que eu poderia esperar até que eu estivesse de volta a casa de Chris, mas eu tinha decidido que eu ia tentar beijá-la quando ela me deixasse, e eu não queria que esse irritante biológico me apressasse para fora do carro. Este seria o meu primeiro beijo.

Eu poderia pensar em várias artimanhas para esconder o que eu precisava fazer. O teatro há muito tempo já estava fechado, então eu só tinha uma opção. Eu disse a ela que eu estava indo para ir atrás do teatro para mijar, mas que eu estaria de volta em "duas balançadas". Obviamente, achei que essa fosse a melhor piada do mundo e ela pareceu se divertir mais com esse fato do que com a piada em si.

No caminho em direção ao teatro Parei e me virei para ela. Perguntei-lhe se Josh já tinha dito a ela que garoto chamado Alex tinha feito algo de bom para mim. Ela parou para pensar por um momento e disse que ele tinha; ela perguntou por que eu havia pedido, mas eu disse que não era nada. Josh realmente era um bom amigo.

Quando eu fui para trás do teatro, percebi que havia uma cerca de arame que se estende fora e correndo paralela às paredes do edifício. Onde eu estava ela ainda podia me ver, e a cerca parecia se estender indefinidamente, então eu pensei que eu pudesse pulá-la, e retornar o mais rápido possível. Pode ter sido muito esforço, mas eu pensei que seria educado. Eu escalei a cerca e andei até que eu estivesse fora de vista e urinei.

Por um momento, os únicos sons eram os grilos na grama atrás de mim e da colisão do líquido e cimento. Estes sons foram dominados por um barulho que eu ainda posso ouvir quando está calmo e não há outros ruídos para distrair meus ouvidos.

À distância, eu ouvi um leve chiado que rapidamente diminuiu apenas para ser substituído por uma cascata de vibrações trovejantes. Percebi rapidamente o que era.

Era um carro.

O rosnar do motor ficou mais alto. E então eu pensei:

Não. Não é mais alto. É mais perto.

Assim que eu percebi isso, eu comecei a voltar em direção à cerca, mas antes que eu pudesse ir muito longe, ouvi um breve grito e um rugido de motor colidindo em algo. Eu comecei a correr, mas depois de apenas dois ou três passos tropecei num pedaço de pavimento solto e me esborrachei no concreto – minha cabeça bateu na quina de uma cadeira quando caí. Eu estava atordoado por talvez trinta segundos, mas o ronco do motor renovado chamou meus sentidos e meu equilíbrio foi restaurado por adrenalina. Redobrei meus esforços. Eu estava preocupado que quem quer que tivesse batido o carro pudesse assediar Verônica. Quando eu estava escalando cerca , vi que ainda havia apenas um carro no estacionamento. Eu não vi nenhuma evidência de uma colisão. Eu pensei que eu pudesse ter julgado mal sua direção ou de proximidade. Enquanto eu corria para o carro de Verônica e como minha orientação mudou, eu vi que o carro tinha batido em algo. Minhas pernas pararam de funcionar quase que completamente.

Foi em Veronica.

O carro estava entre a gente e, só quando finalmente me aproximei o suficiente, pude vê-la.

Seu corpo estava retorcido e amassado como uma perfeita imagem de todas as posições que o ser humano não consegue fazer. Pude ver o osso da tíbia rasgando pela calça jeans. Seu braço esquerdo pendia tão quebrado ao redor do pescoço a ponto da mão tocar o seio direito. Sua cabeça marcara a lataria e a boca pendia aberta, apontando pra cima. Havia tanto sangue. Por um momento, não consegui distinguir se ela estava de bruços ou de costas no chão e tal ilusão me enjoou na hora. Quando se é confrontado por uma coisa que não deveria nunca acontecer, sua cabeça tenta se convencer de que é um sonho e dá aquela sensação de que tudo acontece em câmera lenta. Naquele momento, pensei que iria acordar a qualquer momento.

Mas eu não pude acordar.

Eu me atrapalhei em pegar meu telefone para pedir ajuda, mas eu não tinha sinal. Eu podia ver telefone de Verônica fora do que eu pensei que era o seu bolso da frente. Eu não tive escolha. Tremendo, peguei o telefone dela e quando ele deslizou para fora do bolso, ela se mexeu e engasgou com o ar tão violentamente que pareceu como se ela estivesse tentando respirar o ar do mundo todo.

Isso me assustou tanto que eu cambaleei para trás e caí sobre o asfalto com seu telefone na minha mão. Ela estava tentando ajustar seu corpo para colocá-lo em sua posição natural, mas com cada espasmo de seu corpo, eu podia ouvir seus ossos triturados. Sem pensar, eu fui até ela e coloquei meu rosto sobre o dela e disse apenas:

"Verônica, não se mova. Não se mova, OK? Basta ficar parada. Não se mexa. Verônica, por favor, não se mova."

Eu não parava de dizer isso, mas as palavras começaram a desmoronar quando lágrimas vieram escorrendo pelo meu rosto. Eu abri o telefone. Ele ainda funcionava. Ele ainda estava na tela onde tinha guardado o meu número e quando eu vi aquilo, eu senti meu coração quebrar um pouco. Liguei para o 911 e esperei por ela, dizendo que ela ficaria ok, e sentindo-me culpado por mentir para ela toda vez que eu dizia isso.

Quando o som das sirenes atravessou o ar, ela pareceu tornar-se mais alerta. Ela permaneceu consciente desde que eu a encontrei, mas agora mais do que a luz foi voltando em seus olhos. Seu cérebro ainda estava protegendo-a da dor, porém, parecia que ele estava finalmente permitindo-lhe tornar-se consciente de que algo estava terrivelmente errado com ela. Seus olhos rolaram para o meu e seus lábios se moviam. Ela estava lutando. Pude ouvir:

"Eee ... ele ... tirou. .. min ... foto. M. .. a minha foto ... ele tirou."

Eu não entendi o que ela quis dizer, então eu disse que a única coisa que eu podia. "Eu sinto muito, Verônica."

Eu fui com ela na ambulância, onde ela finalmente perdeu a consciência. Esperei no quarto que tinham reservado para ela. Eu ainda tinha seu telefone, e o coloquei dentro da bolsa de Verônica e liguei para minha mãe a partir do telefone do hospital. Era cerca de 4:00. Eu disse a ela que eu estava bem, mas que Verônica não estava. Ela me xingou e disse que ela iria pro hospital, mas eu disse a ela que eu não iria embora até que Verônica saísse da cirurgia. Ela disse que viria de qualquer maneira.

Minha mãe e eu não falamos muito quando ela chegou. Só disse a ela que sentia muito por mentir e ela respondeu que conversaríamos mais tarde. Acho que, se tivéssemos aberto o jogo na sala – se eu contasse do Boxes ou da noite da jangada, se ela contasse o que sabia –, as coisas talvez poderiam ter se resolvido. No entanto, apenas ficamos em silêncio. Ela falou que me amava e que eu poderia ligar sempre que precisasse.

Quando minha mãe estava se preparando para ir embora, os pais Verônica correram hospital a dentro. Seu pai e minha mãe trocaram algumas palavras que pareciam ser bastante graves, enquanto a mãe de Verônica falou com a pessoa no balcão. Sua mãe era uma enfermeira, mas não trabalhava neste hospital. Tenho certeza de que ela havia tentado transferir Verônica, mas em sua condição, a transferência era proibitiva. Enquanto esperávamos a polícia entrou e falou com cada um de nós - eu disse a eles o que aconteceu, eles fizeram algumas anotações e, em seguida, eles partiram. Ela saiu da cirurgia e noventa por cento de seu corpo estava coberto de gesso branco. Seu braço direito estava livre, mas o resto dela estava ligada como um casulo. Ela ainda estava apagada, mas me lembrei de como eu me sentia quando eu estava com gesso antes do jardim de infância. Pedi uma caneta à enfermeira, mas eu não conseguia pensar em nada para escrever. Dormi em uma cadeira no canto, e fui para casa no dia seguinte.

Voltei todas as tardes durante vários dias. Em algum momento eles haviam colocado outro paciente em seu quarto e junto, uma tela ao redor da cama de Verônica para agir como uma partição. Ela não parecia estar se sentindo melhor, mas ela teve mais momentos de lucidez. Mas, mesmo durante esses períodos, não pudemos realmente conversar. Sua mandíbula tinha sido quebrada pelo carro, e os médicos tiveram de imobilizá-la. Sentei-me com ela por um tempo, mas não havia nada mais que eu pudesse dizer. Levantei-me e fui até ela. Beijei-a na testa e Verônica sussurrou por entre os dentes cerrados:

"Josh.."

Isso me surpreendeu um pouco, mas eu olhei para ela e disse: "Será que ele não vem para vê-la?"

"Não. .."

Eu encontrei-me realmente irritado. "Mesmo que Josh tivesse se metido em encrenca, ele ainda devia vir ver sua irmã", pensei.

Eu estava prestes a expressar isso quando ela disse: "Não.. Josh.. ele fugiu. Eu deveria ter te contado."

Eu senti o sangue me congelar as veias

"Quando? Quando isso aconteceu?"

"Quando ele tinha treze anos."

"Será que.. ele deixou uma nota ou algo assim?"

"Em seu travesseiro.."

Ela começou a chorar e eu a segui, mas acho que agora nós estávamos chorando por razões diferentes, mesmo que eu não tivesse percebido isso. Neste ponto havia um monte de coisas que eu ainda não lembrava da minha infância, e havia um monte de conexões que eu ainda não tinha feito. Eu disse a ela que eu tinha que ir, mas que ela poderia me mandar uma mensagem a qualquer momento.

Eu recebi um texto dela no dia seguinte dizendo-me para não voltar ao hospital. Perguntei por que e ela disse que não queria que eu a visse daquele jeito de novo. Concordei a contragosto. Nós conversávamos por mensagem todos os dias, mas eu mantive isso em segredo da minha mãe , porque eu sabia que ela não gostava que eu falasse com Verônica. Normalmente, seus textos eram bastante curto, e na maior parte apenas em resposta a textos mais longos que eu mandava. Eu tentei ligar pra ela apenas uma vez, eu tinha certeza de que seus pais estavam "rastreando" as chamadas, mas esperava que eu pudesse ouvir sua voz; ela atendeu, mas não disse nada - eu podia ouvir como sua respiração era difícil. Cerca de uma semana depois que ela me disse para não ir mais vê-la, ela me enviou um texto que simplesmente estava escrito,

"Eu te amo".

Eu estava cheio de tantas emoções diferentes, mas eu respondi , expressando o mais prevalente de todas. Eu respondi:

"Eu também te amo."

Ela disse que queria ficar comigo, e que mal podia esperar para me ver de novo. Ela me disse também, que tinha sido liberada e estava convalescendo na casa dela. Ficamos trocando mensagens por semanas, mas cada vez que eu pedia para vir vê-la, ela dizia "em breve". Continuei insistindo e na semana seguinte, ela disse que poderia assistir à um filme na sessão da meia-noite no teatro. Eu não podia acreditar, mas ela insistiu que ela iria tentar. Eu recebi um texto seu na tarde da sessão do filme, dizendo:

"Vejo você hoje à noite."

Eu pedi a Ryan para me levar, uma vez que os pais de Chris haviam descoberto o que tinha acontecido e disseram que eu não era mais bem-vindo em sua casa. Expliquei a Ryan toda a situação, que ela podia estar em más condições, mas que eu realmente me preocupava com ela, e pedi que ele nos desse algum espaço. Ele aceitou isso e fomos para lá.

Verônica não apareceu.

Eu tinha guardado um lugar para ela ao meu lado, perto da saída para que ela pudesse entrar e sair facilmente, mas dez minutos depois do filme começar, um homem sentou-se na cadeira. Eu sussurrei, "Desculpe-me, este assento está ocupado", mas ele não respondeu nada; ele apenas olhou para a frente para a tela. Lembro-me de querer mudar de lugar, porque havia algo de errado com a maneira como ele estava respirando, mas acabei desistindo, porque eu percebi que ela não viria.

Eu mandei uma mensagem para ela no dia seguinte perguntando se ela estava bem e eu perguntei por que motivo ela não apareceu na noite anterior. Ela respondeu com o que viria a ser a última mensagem que eu receberia dela. Ela simplesmente disse:

"Vou vê-lo novamente. Em breve."

Ela estava delirando, e eu estava preocupado com ela. Enviei -lhe várias mensagens lembrando-lhe sobre o filme e dizendo que não era grande coisa, mas ela simplesmente parou de responder. Eu ficava cada vez mais chateado ao longo dos próximos dias. Eu não podia visitá-la, porque eu não sabia seu telefone, e eu não tinha certeza de onde viviam. Meu humor tornou-se cada vez mais deprimido, e minha mãe, que tinha sido muito boa ultimamente, me perguntou se eu estava bem. Eu disse a ela que eu não tinha recebido notícias de Verônica há dias, e eu senti que ela ficou nervosa.

"O que você quer dizer?"

"Ela deveria me encontrar no cinema ontem. Eu sei que passou apenas três semanas desde que ela foi atropelada, mas ela disse que tentaria ir, e depois disso ela simplesmente parou de falar comigo por completo. Ela deve me odiar."

Ela parecia confusa, e eu podia ler em seu rosto que ela pensava que eu tinha ficado louco. Quando ela viu que eu não tinha, seus olhos começaram a lacrimejar e ela me puxou em sua direção, me abraçando. Ela estava começando a chorar, mas parecia um choro muito intensopor eu ter levado um bolo de uma garota, e eu não tinha nenhuma razão para pensar que ela particularmente se importava com Verônica. Ela respirou fundo e, em seguida, disse algo que ainda me dá náuseas, mesmo agora. Ela disse:

"Verônica está morta, querido. Oh Deus, eu achava que sabia. Ela morreu no último dia que você a visitou. Oh meu amor, ela morreu há semanas atrás."

Ela estava completamente abalada, mas eu sabia que não era por causa de Verônica. Eu a afastei e cambaleei para trás. Minha mente estava em colapso. Isso não era possível. Eu tinha trocado mensagens com ela ontem. Eu só conseguia pensar em uma pergunta, e foi provavelmente foi a coisa mais trivial que eu poderia perguntar.

"Então por que seu telefone ainda estava ligado?"

Ela continuou a soluçar e não respondeu.

E explodi, "Por que demoraram tanto tempo para DESLIGAR O MALDITO NÚMERO DE TELEFONE?!"

Seu choro diminuiu o suficiente para que ela pudesse murmurar: "As fotos.."

Eu viria a descobrir mais tarde, que seus pais pensaram que seu telefone havia sido perdido no acidente, apesar de eu ter colocado em sua bolsa na noite em que foi levado para o hospital. Quando recuperaram seus pertences, o telefone não estava entre eles. Eles pretendiam entrar em contato com a empresa de telefonia no final do mês para desativar a linha, mas eles receberam um telefonema informando-os sobre uma conta enorme por conta de centenas de fotos que haviam sido enviados a partir de seu telefone. Imagens. Imagens que foram todas enviados para o meu celular. Fotos que eu nunca tive, porque o meu telefone não podia recebê-los. Eles descobriram que todas as fotos foram enviadas após a noite em que ela morreu. Eles desativaram o telefone imediatamente.

Eu tentei não pensar sobre o conteúdo dessas fotos. Mas lembro de me questionar se, por algum motivo, eu estaria em qualquer uma delas.

Minha boca ficou seca e eu senti a picada dolorosa de desespero enquanto eu pensava na última mensagem que recebi de seu telefone..

"Vou vê-lo novamente. Em breve."

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